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Ex-vice-presidente de Barack Obama e um veterano da política de 77 anos, o democrata Joe Biden foi eleito o 46º presidente dos Estados Unidos na tarde deste sábado, segundo projeções de diferentes veículos da imprensa americana. Biden foi dado como vitorioso após assegurar sua vantagem no estado da Pensilvânia, somando 273 votos no Colégio Eleitoral, três a mais do que mínimo de 270 necessário para garantir a vitória nacional.
“Estou honrado pela confiança que o povo americano depositou em mim e na vice-presidente Kamala Harris. Frente a obstáculos inéditos, um numero recorde de americanos votou, provando uma vez mais que a democracia bate fundo no coração dos Estados Unidos. Com o fim da campanha, é hora de deixar a raiva e a retórica agressiva para trás e nos unirmos como uma nação. É hora de os Estados Unidos se unirem. E de curar. Nós somos os Estados Unidos da América. E não há nada que não possamos fazer, se fizermos juntos”, disse Biden em nota assim que sua vitória foi dada como certa.
A campanha do presidente Donald Trump, que vem alegando falsamente a ocorrência de fraudes contra ele e lançou uma ofensiva judicial para contestar os resultados em vários estados onde o democrata foi vitorioso, indicou que não reconhecerá a derrota logo.
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Com a provável votação recorde deste ciclo eleitoral, Biden se tornará o presidente com maior número de votos da História americana, mais de 74,3 milhões, 4 milhões a mais do que os 70,2 milhões obtidos por Trump, ultrapassando o correligionário Barack Obama na eleição de 2008. O número deve crescer ainda mais quando a contabilização total dos votos terminar.
A importância da Pensilvânia para a vitória de Biden é cheia de simbolismos. Estado em que a Declaração de Independência e a Constituição dos EUA foram assinadas, na cidade de Filadélfia, a Pensilvânia faz parte da chamada “muralha azul“, antigo reduto democrata que foi conquistado por Trump na eleição de 2016 e que agora volta ao controle do partido.
O resultado eleitoral também consagra outro ineditismo: a vice-presidente eleita, Kamala Harris, é a primeira mulher no cargo. A senadora pela Califórnia, de origem indiana e jamaicana, é também a primeira pessoa negra e de origem asiática a ser eleita para a Vice-Presidência.
Com a vitória de Biden, Donald Trump se torna o décimo presidente incumbente a ser derrotado na campanha à reeleição na História dos EUA. O último foi o também republicano George H. Bush, eleito em 1988 e derrotado pelo democrata Bill Clinton em 1992. Levando em conta as eleições dos últimos 50 anos, completam a lista o democrata Jimmy Carter, que perdeu a eleição de 1980 para Ronald Reagan, e o republicano Gerald Ford, superado pelo próprio Carter quatro anos antes.
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Durante a campanha e em seus últimos pronunciamentos, Biden prometeu “curar o país” da polarização extrema que marcou o governo Trump e que chegou ao ápice durante a apuração, quando o presidente republicano chegou a declarar vitória sem que tivesse os votos necessários para isso e depois chamou de “ilegais” as cédulas que favoreceram o seu adversário, sendo criticado mesmo por políticos de seu partido.
Além da Pensilvânia, Biden lidera a apuração nos estados da Geórgia, Nevada e Arizona. Dos estados onde o resultado final ainda não foi projetado, Trump só deve vencer na Carolina do Norte.
A confirmação da vitória de Biden na Geórgia, terra do líder defensor dos direitos civis Martin Luther King, num ano de protestos contra o racismo no país, ganharia um peso ainda maior: seria o primeiro democrata a vencer no estado desde 1992. No entanto, os votos no estado deverão passar por uma recontagem, como preveem as leis estaduais caso a diferença entre o vencedor e o segundo colocado seja menor ou igual a um ponto percentual.
Candidato unificador
Esta foi a terceira vez que Biden concorreu à Presidência. Nas outras duas ocasiões, em 1987 e 2008, não obteve êxito nas primárias do Partido Democrata. Neste ano, no entanto, ele despontou como uma figura unificadora diante da divisão na legenda.
Senador pelo estado de Delaware por 36 anos e vice-presidente de Barack Obama (2009-2017), Biden se lançou na corrida democrata com o lema “Batalha pela alma da nação” e, apesar de patinar no início da temporada de primárias, acabou superando 20 correligionários na disputa mais fragmentada em décadas.
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O presidente eleito costurou acordos com as alas centristas e à esquerda do partido e garantiu uma plataforma que se mostrou capaz de energizar eleitores democratas, em especial minorias, em estados-chave para a disputa presidencial.
Biden se elegeu para o primeiro cargo político há 51 anos, ao conquistar um assento na Assembleia do condado de Newcastle. Em 1973, derrotou o republicano incumbente J. Caleb Boggs na disputa para o Senado pelo estado de Delaware.
Ele se reelegeu de forma consecutiva até 2009, quando tomou posse como vice-presidente de Obama. O presidente eleito, notório articulador no Congresso e protagonista de importantes acordos bipartidários, contrasta diretamente com o apelo de “outsider” da política que levou Trump à Casa Branca há quatro anos.
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O presidente eleito chegou a cogitar entrar na disputa pela nomeação democrata em 2016, mas a morte prematura de seu filho Beau, vítima de um câncer em 2015, o demoveu da ideia. Na ocasião, os democratas escolheram Hillary Clinton, que recebeu a maioria do voto popular mas acabou derrotada por Trump no Colégio Eleitoral
Os anos Trump
A vitória de Biden põe fim ao governo Trump, que acirrou a polarização no país ao fazer uso recorrente da mentira como estratégia política e usar expressões racistas e xenófobas que já não faziam mais parte do léxico da política aceitável nos EUA pelo menos desde os anos 1960.
Na fronteira do México, embora republicano não tenha sido o primeiro presidente a deportar milhares de imigrantes sem documentos, a política de separação de crianças de seus pais levou sua política a um nível mais extremo.
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O republicano rompeu com muitas das instituições multilaterais criadas sob a égide dos Estados Unidos depois da Segunda Guerra Mundial, se afastou dos aliados europeus e provocou a corrosão da liderança internacional e do prestígio americano pelo mundo.
Em seu governo, os EUA deixaram o Acordo de Paris sobre o Clima e abriram o processo para sair da Organização Mundial de Saúde, acusando a agência da ONU de proteger a China na pandemia do novo coronavírus — um reflexo da retórica agressiva que Trump adotou contra Pequim na guerra pela hegemonia econômica global.
Embora não tenha sido a primeira liderança eleita do movimento ultraconservador que veio a ser definido como nacional-populismo, Trump se tornou uma espécie de liderança informal do grupo, que costuma seguir sua estratégia de comunicação política e inclui o presidente Jair Bolsonaro.
Na Justiça americana, e graças ao controle republicano do Senado, Trump promoveu uma revolução conservadora nos tribunais federais, nomeando mais juízes do que todos os seus antecessores desde Jimmy Carter. No fim do mandato, ele conseguiu emplacar a juíza Amy Coney Barrett para a Suprema Corte, consolidando uma maioria de seis juízes conservadores a três progressistas.
Batalha judicial
A campanha do presidente Donald Trump já iniciou uma batalha jurídica para contestar a vitória. Pediu a recontagem dos votos em Wisconsin e entrou com ações nos estados de Geórgia, Michigan e Pensilvânia. Nos dois primeiros estados, os pedidos foram negados.
Trump voltou a questionar a integridade do processo eleitoral neste sábado, em postagem no Twitter. Na quinta, sem apresentar provas, ele falou em “votos ilegais” e em conspiração para impedir sua vitória. Vários meios de comunicação americanos interromperam a transmissão deste pronunciamento, sob o argumento de que as mentiras são uma ameaça à democracia.