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Luciano Bandeira, presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RJ), se mostrou indignado com a morte de Agatha Vitória Sales Félix, de 8 anos, na noite dessa sexta-feira, no Complexo do Alemão , Zona Norte. A menina estava dentro de uma kombi quando foi atingida nas costas por um tiro de fuzil.
Segundo moradores, o autor do disparo seria uma policial militar da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) da comunidade, que teria suspeitado de um motociclista que passava no local. Em nota, a PM informou que a Coordenadoria de Polícia Pacificadora vai abrir um procedimento apuratório para verificar as circunstâncias do fato.
– Chegou a um extremo tão grande… É a morte de uma criança cujo o único pecado que cometeu na vida é o de ser pobre. Por que a política de segurança do Estado é voltada para uma uma política de extermínio. No estado do Rio, hoje, já temos 1.249 mortos e, infelizmente, com essa nova desgraça da morte da menina Agatha, ontem, demonstra que é uma política que não protege o cidadão, muito menos o mais vulnerável, que é aquele oprimido pelo tráfico e pelas forças de segurança do Estado – afirmou Bandeira.
O presidente da OAB ainda disse se impressionar com a afirmação do governador Wilson Witzel de que continuará procedendo com a mesma política de segurança.
– O que estarrece é que depois da morte de uma criança a afirmação é que continuarão procedendo dessa forma. Ou seja, vão matar mais crianças, mais inocentes, e chegar a índices inimagináveis em um país onde não está em uma guerra aberta, numa guerra campal. Não há remorso, mea culpa, uma vontade de repensar a política de atuação para evitar que outras mortes como essa continuem acontecendo. A perspectiva que temos é que outras Agathas virão em muito pouco tempo. A sensação da sociedade civil, da OAB é de perplexidade e indignação – disse.
O caso Agatha
A menina Agatha Vitória Sales Félix, de 8 anos, não resistiu aos ferimentos e morreu na madrugada deste sábado. Ela foi atingida nas costas por um tiro de fuzil , na noite desta sexta-feira, na Fazendinha, no Complexo do Alemão, Zona Norte do Rio. Ágatha estava dentro de uma Kombi no momento em que foi baleada. A criança foi levada para o Hospital estadual Getúlio Vargas, na Penha, Zona Norte. Na manhã deste sábado, parentes e amigos foram até o Instituto Médico Legal (IML), no Centro, para a liberação do corpo. Ainda não há informações sobre o enterro.
Segundo um parente que não quis se identificar, Agatha estava com a mãe no momento em que a kombi transportava passageiros para dentro da comunidade. A família acusa uma PM como autora do tiro.
— A policial queria acertar um motociclista que estava passando próximo. Temos policiais despreparados nas ruas, e é isso que acontece — destaca o rapaz: — A mãe estava com a Agatha no colo, mas, no momento do tiro, havia acabado de colocá-la ao seu lado.
A corporação informou que equipes da UPP estavam baseadas na esquina da Rua Antônio Austragésilo com a Rua Nossa Senhora quando foram atacadas por criminosos. Os agentes revidaram, segundo a PM. Ainda de acordo com a Polícia Militar, moradores informaram à equipe que a menina havia sido baleada na localidade conhecida como Estofador. Os agentes foram ao Hospital Getúlio Vargas, onde confirmaram a entrada da vítima, ferida por arma de fogo, na unidade de saúde.
O avô materno da criança, identificado como Ailton Félix, esteve no Getúlio Vargas e pediu explicações sobre o disparo:
A mãe de Agatha, identificada apenas como Vanessa, teve que sair do hospital de cadeiras de rodas. Ela passou mal ao saber da notícia e teve que ser amparada por familiares e amigos.
Manifestação reúne moradores no Alemão
Na manhã deste sábado, dezenas de moradores e ativistas sociais fazem uma manifestação pacífica pelas ruas do Complexo do Alemão. Carregando faixas e cartazes, eles pedem pelo fim das mortes de crianças e jovens em comunidades do Rio. Com a ajuda de um carro de som, os manifestantes também pedem a presença do governador Wilson Witzel. Além disso, citam os nomes de moradores mortos em ações policiais seguidos pelo termo “presente”, grito que ganhou destaque após a morte da vereadora Marielle Franco.
Em todas as comunidades se perdem vidas inocentes por essa política montada pelo governo do Estado. O Complexo do Alemão está presente, sim! Não queremos que a Agatha venha a ser apenas mais uma foto estampada. Vamos lutar pelos nossos direitos dentro da comunidade, onde vários inocentes são atingidos por ‘balas achadas’ — afirma um manifestante sem se identificar.
Outro manifestante critica a política adotada por Wilson Witzel.
— Esse protesto é pela morte de uma criança que foi alvejada por um policial despreparado que recebeu a ordem do governador para atirar. E atiraram pelas costas de uma criança que ia para sua casa. Estamos pedindo paz, não criamos nossos filhos para perdê-los numa guerra desproporcional dentro da comunidade. Um governo que entra falando de guerra. O governador hoje tem essa política de matar. O que ele está querendo para o Rio de Janeiro? Vamos resistir por nossos filhos.
Nas janelas e varandas da Avenida Itararé, onde a manifestação ocorre, moradores agitam panos brancos como sinal de paz. Mototaxistas também acompanham o grupo. O coletivo Mães de Manguinhos também participa do ato para apoiar a família de Agatha.
Nós estamos cansados desses caveirões aéreos, desses caveirões terrestres. Basta do sangue do povo negro derramado na favela. Viemos aqui para lutar por essas vidas, crianças que vocês estão levando. Nos deixem viver em paz, sem essa falácia da guerra contra as drogas. Chega, são os nossos jovens que estão morrendo — afirma uma das mães do coletivo durante a caminhada pacífica.
Defensoria Pública: confronto se mostra ineficaz
A Defensoria Pública do Rio emitiu uma nota de solidariedade: “A defesa do direito à vida é um dos princípios basilares da nossa instituição. Por esta razão, acreditamos em uma política de segurança cidadã, que respeite os moradores das favelas e de qualquer outro lugar. A opção pelo confronto tem se mostrado ineficaz: a despeito do número recorde de 1.249 mortos em ações envolvendo agentes do estado apenas este ano, a sensação de insegurança permanece. No caso das favelas, ela se agrava”, diz o texto, que lembra também a morte do policial Leonardo Oliveira dos Santos , atingido em Niterói.
A nota reforça ainda que, “se coloca à disposição dos familiares de Ágatha — e de todo cidadão fluminense” — para auxiílio jurídico.
Veja a nota completa da PM
“A Assessoria de Imprensa da Secretaria de Estado de Polícia Militar informa que, por volta das 22h desta sexta-feira, 20/09, equipes policiais da UPP Fazendinha, que estavam baseadas na esquina da Rua Antônio Austragésilo com a Rua Nossa Senhora, foram atacadas de várias localidades da comunidade de forma simultânea. Os policiais revidaram.
Após o confronto, não foram encontrados feridos na varredura do local. Na sequência, os policias foram informados por populares que um morador teria sido ferido na localidade conhecida como “Estofador”. Uma equipe da UPP se deslocou até o Hospital Getúlio Vargas e confirmou a entrada de uma criança de 8 anos ferida por disparo de arma de fogo.
A Coordenadoria de Polícia Pacificadora (CPP) irá abrir um procedimento apuratório para verificar todas as circunstâncias da ação.”